O mistério do vinho
O padre estava preocupado porque o vinho da sacristia estava evaporando. Todo santo dia, quando se ajeitava para celebrar a missa, deparava-se com a garrafa quase seca, de modo que restava bem pouco para as galhetas. Mesmo não querendo acreditar que algum paroquiano seu estivesse entortando o cálice com a bebida que era exclusivamente para o rito sacramental, o velho pároco começou a levantar hipóteses.
Suspeitou primeiro do sacristão, um jovem que sempre o ajudava na preparação das celebrações. Acompanhou seus movimentos por alguns dias, mas não achou nada que pudesse incriminá-lo. Passou para o segundo suspeito, um ministro da Sagrada Comunhão com longos anos de experiência e dedicação ao seu ministério. Investigou cuidadosamente cada passo do idoso, mas nada. E assim foi por algumas semanas, o vinho sumindo e o sacerdote investigando. Com a lista de suspeitos quase completa, só havia mais alguém na reta. O coroinha.
O padre retomou sua jornada investigativa, mas seus dias de Sherlock Holmes não duraram muito, pois o investigado não tinha culpa alguma. Cansado, mas disposto a desvendar o enigma, instalou uma câmera na sacristia. E nem precisou esperar muito. Graças às imagens captadas, logo no primeiro dia, ficou conhecendo o criminoso.
Era mais ligeiro que qualquer um, tinha habilidade para entrar e sair de qualquer ambiente e suas patinhas eram ágeis com a rolha da garrafa. O religioso, mesmo perplexo, tomou uma atitude drástica, reteve o bichano na sacristia durante a missa e só o liberou na hora dos avisos paroquiais para anunciar a sua doação.
Uma senhorinha muito piedosa que marcava presença semanalmente naquela igreja ergueu a mão e se propôs a levar o gato para casa. O bom padre queria alertar a futura tutora sobre a dependência canônica do seu novo pet, mas não havia tempo. Limitou-se a dizer para não trazê-lo à Igreja. A senhora, um pouco envergonhada, disse que o gato já lhe era conhecido e enquanto a assembleia esperava a bênção final, ela cochichava para o celebrante:
- Me perdoe, padre, mas eu não sei o porquê do gato tomar o rumo da casa de Deus, apenas desconfio que seja por um milagre.
- Como assim? Questionou o padre.
- É que meu gatinho costumava seguir meu marido pro buteco, mas desde que eu rezei a Novena de Santa Rita pedindo que o traste parasse de beber, o gato aprendeu o caminho da igreja. O que devo fazer?
- Faça outra novena.
- Mas já alcancei a graça…
- Para o gato, concluiu o reverendo.
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