
Como eu comecei a gostar de ler (foi só a partir dos 20 anos)
Por escrever crônicas, as pessoas costumam acreditar que meu interesse por literatura veio de berço, que fui alfabetizado nos primeiros anos da infância, que era uma espécie de pequeno gênio devorador de livros.
Mas a história é bem diferente. Eu era apenas mais um piá ranhento que preferia jogar bola, soltar pipa, ficar à toa na rua ao invés de encarar letras amontoadas e tediosas num pedaço de papel. Eu gostava, sim, de criar histórias, mas elas só serviam para as minhas brincadeiras.
Minhas criações apenas me ajudavam a dar asas à imaginação. Curtia gibis e histórias em quadrinhos, mas não era fã de leitura, preferia contemplar as imagens. A partir delas, buscava criar um mundo próprio. Se eu fosse fã de leitura, seria muito mais fácil.
E não é que nenhum livro tenha me interessado. Houve um que me fez querer ler. “Uma História de Futebol", do José Roberto Torero, lançado pela Editora Objetiva para uma coleção chamada Literatura em Minha Casa.
Todos os dias eu o lia, e isso só foi possível porque não o devolvi para minha escola. Recentemente, mandei um direct para o Torero. Falei sobre a importância dessa sua obra e tudo mais, mas não comentei nada a respeito de ter surrupiado um livro.
E foi só.
Passaram-se os anos, fui crescendo e mandei a leitura para escanteio. Veio a adolescência, o ensino médio, o contato com a literatura nacional e com ela "Dom Casmurro".
Um livro que li de arrasto, pulando trechos e, em algumas ocasiões, apenas olhando para as palavras sem saber o que elas significavam, como um chimpanzé fitando um panfleto. Na aula, a professora perguntava: Bentinho traiu ou não traiu a Capitu? Sei lá, pouco me importava com este caso passional. E outra, nunca gostei de fofoca.
O tempo correu e a leitura não era um hábito. Eu até tinha livros, mas serviam como adereços em meu quarto.
Num belo dia, aos 20 anos, já na faculdade de jornalismo, fui confrontado com a minha ignorância. Eu escrevia horrivelmente, torturava a gramática e afrontava a última flor do lácio, inculta e bela. Só havia um remédio para este mal.
O que pessoas com hábito de leitura têm de especial para encontrar tanto prazer nos livros? Eu me perguntava. Fui experimentar para saber. Comecei pelo que já tinha em casa, alguns títulos que só havia lido a capa. Uma leiturinha aqui, outra ali.
Certo dia comprei um notebook numa loja de eletro — sim, fui bem sem noção. O vendedor me ludibriou e eu acabei levando para casa um Positivo Sim +, uma marca nacional que reforçava sua nacionalidade trazendo 5 obras de autores brasileiros em um programa pré-instalado. Eu me interessei.
Foi nesta época da vida que percebi a leitura como um universo à parte. Que entendi o papel do leitor. E mais, compreendi que eu poderia ser uma parte ativa daquilo que lia.
Descobri que o gosto pela leitura começa por aceitar um convite. Antes da minha descoberta, pouco ou quase nada os livros me diziam algo, de maneira que as leituras eram um enorme sacrifício. Hoje, acredito que tudo o que leio pode me dizer algo, mesmo que a leitura não avance. Claro que fica mais fácil quando estou em contato com temas, estilos e gêneros que me agradam.
E depois veio a escrita, que selou de vez meu hábito de leitura. Estou até pensando aqui, pode ser que o inverso também funcione.
Você tem o hábito de leitura?
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