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Por que você se sente em guerra consigo mesmo? Desvende a luta interna que define sua vida

  • Foto do escritor: Jordino
    Jordino
  • há 4 dias
  • 7 min de leitura
Por que você se sente em guerra consigo mesmo? Desvende a luta interna que define sua vida

Por que você se sente em guerra consigo mesmo? Desvende a luta interna que define sua vida


Transcendência significa a existência de algo além de si mesmo. Já a imanência é o contrário, é algo em si mesmo. É assim que muitas vezes enxergamos nossa realidade, num momento transcendemos sendo guiados por ideais elevados, enquanto em outros somos sabotados por desejos contraditórios, até mesmo impulsos selvagens. Têm dias que você quer cumprir tudo o que está em sua lista de tarefas, mas em outros você quer largar tudo. 


Você já se sentiu como se tivesse duas versões de si brigando o tempo todo? Fique neste texto, pois hoje você verá como a identidade, o isolamento e o autoconhecimento se unem para fazer de você o ser mais complexo de todos os tempos, cheio de contradições e multiplicidades e o quanto reconhecer isso é fundamental para você obter uma vida mais satisfatória.


Você é um lobisomem


Peço desculpas por já começar o texto dessa forma, mas eu preciso dizer que você é uma espécie de lobisomem. Isso não é uma ofensa, tá bom? Digo isso apenas para informar que dentro de você habita um lobo, que não é só um lobo, é o lobo da estepe. Estepe é um tipo de vegetação, ok? E o Lobo da Estepe é um livro do alemão Hermann Hesse, nobel de literatura, inclusive. Mas, assim como o lobisomem, este ser metamórfico, você também convive com um lado humano. É o clássico exemplo do arquétipo duplo, representando a razão e o instinto, a civilização e a selvageria. Viu como não é nada pessoal?


E aqui está um ponto fundamental para compreendermos essa dualidade. De acordo com Karl Jasper, psiquiatra e filósofo alemão, “o homem é o ser que não só existe, senão que sabe que existe. Consciente de si mesmo, explora o mundo, e, projetando, o transforma”. Ou seja, todos os demais seres vivem orientados pelas suas próprias necessidades orgânicas. Mas o homem, ah, o homem, ele é o diferentão. Ok, mas isso implica no que exatamente?


Implica que nisso há uma certa inquietude humana, porque para nós, viver e estar bem são coisas que não podem estar separadas. Tudo o que você e eu fazemos é nos empenharmos para termos uma vida boa. Estamos sempre buscando as melhores condições para nossa vida e, justamente por isso, trabalhamos, estudamos, empreendemos, traçamos metas, nos relacionamos e por aí vai. Mas e quando os nossos “eus” não se entendem e tretam entre si prejudicando nossa busca por viver bem? O que fazer? 


Definitivamente, você não está sozinho


Bom, primeiramente é preciso entender que essa sensação de treta interna não é coisa só de alguns, ela está na base da nossa existência e trombamos com ela diariamente. Você sabe que precisa ler mais para se desenvolver, mas tem aquela série para maratonar, um jogo para jogar, redes sociais para checar e segue a lista.


Quantas vezes você já se propôs a acordar cedo para malhar, mas acabou apertando o botão soneca e dormindo mais um pouco? Ou aquela dieta que apareceu pela primeira vez na sua lista de metas em 2018, mas que em 2025 ainda não saiu do papel? E o trabalho ou aquele projeto que você vive procrastinando para resolver? Isso é o puro suco da dualidade em ação: seu lado racional quer saúde, disciplina, desenvolvimento pessoal, cultura, enquanto seu lado instintivo busca conforto e prazer imediato.


Cabe a você escolher o prazer ou responsabilidade, o trabalho ou a paixão. A liberdade ou a segurança. Este estado de escolhas, de estar se sentindo pressionado a tomar uma decisão determinante para o futuro gera frustração e culpa. Você já sentiu esse conflito dentro de você?


Um cabo de guerra tensionado dentro de nós


No livro O Lobo da Estepe, temos o personagem central, Harry Haller, um sujeito no alto dos seus 50 anos que se divide entre o seu lado burguês que mantém sua vida estruturada e seu lado instintivo e selvagem, que deseja a liberdade e a expressão. Isso o leva a uma série de questionamentos.  O lado Lobo de Harry o faz sentir-se isolado e alienado à sociedade moderna e assim ele vive um conflito interno, onde busca preencher o vazio de sua vida por meio da arte, filosofia e introspecção. Logo ele percebe que a verdadeira realização está além do intelecto.


Então é isso? Temos duas vozes dentro de nós que lutam para serem ouvidas? Uma espécie de anjinho e diabinho à la Tom e Jerry? 


São Paulo e uma certa lei que atua em nós


Vejamos, por exemplo, na Carta de São Paulo aos Romanos 7:18-21, Paulo diz: Pois o que faço não é o bem que desejo, mas o mal que não quero fazer, ahhhh, esse eu continuo fazendo. E ainda. “”Assim, encontro esta lei que atua em mim: quando quero fazer o bem, o mal está junto de mim”.


Perceba que aqui, também testemunhamos uma luta interior do apóstolo. Novamente trata-se de uma busca interior por algo elevado, além de si, uma espécie de transcendência. Claro, neste caso, temos um aspecto religioso cristão. Por isso cito o frei franciscano Sinivaldo Tavares, professor e pesquisador acadêmico que nos diz: embora vivamos bem e sintamos este mundo como nossa casa, ronda-nos perenemente a sensação de nos sentirmos deslocados, sem lugar, errantes e inquietos buscando algo a mais: expectativas? Saudades? Sonhos?


O médico, o monstro e professor aloprado


A literatura está cheia de exemplos de uma certa dualidade humana. Em o Médico e o Monstro de Robert Louis Stevenson, por exemplo, temos o doutor Jekyll um médico, civilizado e respeitado na sociedade, empenhado em suas pesquisas e disposto a contribuir para o bem-estar geral através do conhecimento, mas que criou uma droga que o possibilita ser também Mr. Hyde, uma versão selvagem e sem escrúpulos de si, entregue aos prazeres e à luxúria. Jekyll usava dessa descoberta para gozar de plena liberdade moral e assim deleitava-se pelas ruas de Londres. De acordo com seus interesses, ora era o médico, ora o monstro. 


Para você entender melhor, lembre-se do filme o Professor Aloprado, estrelado por Eddie Murph em sua versão mais famosa, este filme foi inspirado no Médico e o Monstro. No filme, Sherman é um cansado professor universitário, reconhecido pela sua inteligência, mas nada atraente, porém era só tomar da sua droguinha que se transformava em Buddylove, uma versão atlética, carismática, sedutora e divertida de si. 


Agora vem comigo. Se você pudesse, também criaria uma versão de si para aproveitar de liberdade moral? Essa luta interior não existe, talvez, só porque não podemos nos dividir? Ou seja, não há como estar livre da auto-responsabilidade? Vamos deixar essa reflexão mais acessível: se você pudesse ter um super poder, desses que os heróis possuem, qual seria e para qual finalidade você usaria? 


Alma viajante, corpo acomodado


Para o filósofo francês Gabriel Marcel, o homem tem um chamado a essência existencial não só a realidade que o cerca, mas também a possibilidade de um alcance à plenitude. Isso é perfeito para explicar nossa dualidade. Pois não há como se isentar da realidade e suas influências.


Assim podemos compreender que o homem é muito mais do que aparenta ser, pois dessa forma ele se constitui tirando da sua própria experiência vivencial o aprendizado para sua existência. Ou seja, não é possível que simplesmente o reduzamos condicionando-o a sistemas de pensamento ou esquemas e categorias. E aqui já dou uma pista do que está por vir.


A parada é complexa. O homem é um ser viajante, a caminho, desejando sempre ir além de si mesmo e de sua própria realidade. E aqui tocamos em um ponto importante. Porque Marcel diz que é a alma justamente, que é viajante, sendo por ela que o homem cria um vínculo sagrado com a vida. E a partir de uma reflexão sobre si que ela passa de um caminho a outro, na busca por encontrar-se de maneira mais profunda com sua existência.


Isso significa que querendo ou não, estamos buscando sempre o que está além, e isso parece ser uma tarefa da alma, um desejo que não é compartilhado pelo nosso outro eu, uma parte de nós que não é tão elevada, mais instintiva e imediata. Tá, ok, isso é muito interessante. Mas e se eu disser que não estamos resumidos a apenas dois lados? Trata-se somente do Lobo e o Homem, como no livro de Hermann Hesse?


De volta ao Lobo da Estepe: Haller doidão


Essa é a grande sacada na obra de Hesse. Lá pelas tantas, Harry Haller, o personagem da trama, tem uma experiência em um certo Teatro Mágico, onde ele expande sua consciência e depara-se como um ser multifacetado. A partir desse evento ele começa a encarar todas as partes do seu ser. Ele aprende a rir de si mesmo e de todas as tensões que antes o consumia. Ele experimenta uma libertação ao aceitar que não é um ser simples, ao contrário é cheio de contradições e camadas.


Sim, a luta entre nosso instinto e nossos ideais são inevitáveis, mas o autor sugere que a verdadeira liberdade vem da aceitação da nossa natureza múltipla. 


O autoconhecimento, que por vezes pode ser um processo doloroso, é o caminho para uma vida mais plena e autêntica. Mas já adianto que isso é coisa só para loucos e raros, conceito este que está no centro do Lobo da Estepe. Esta mensagem é um convite só pra quem está disposto a romper com as conformidades sociais e explorar a vastidão do próprio ser. Ou seja, se você ousar questionar suas limitações e aceitar a sua multiplicidade, você será um louco e um raro.


Haller só encontrou paz quando abraçou tanto sua racionalidade quanto seus impulsos mais irracionais. O Lobo da Estepe nos lembra que essa luta interna é parte essencial da vida, mas que a verdadeira liberdade e paz vêm da aceitação e do reconhecimento de nossa complexidade.


O que você pensa sobre enfrentar verdades incômodas sobre si mesmo e reconhecer que é muito mais do que apenas duas forças opostas?


Viagem ao fundo do ego


Então eu te digo que, tal como na Canção Viagem ao Fundo do Ego, da banda Egotrip, para realmente compreender a si mesmo, é preciso mergulhar nas profundezas da mente e confrontar as diversas camadas da própria identidade. 


Essa jornada de autoconhecimento não aliena o ímpeto do homem a buscar a transcendência, ao contrário, ela favorece, gerando um equilíbrio, revelando um lado natural da imperfeição. 


Por isso deixo-vos uma mensagem de esperança, que pode parecer meio paradoxal. A meta pode ser aquilo que está além do mundo porque há sim muito valor nisso, o contrário, permanecer no mundo, significa obter só aquilo que já está aqui. E o que temos aqui é imperfeito, assim como nós somos imperfeitos, ter o foco aqui pode nos colocar cara a cara com o fracasso mais frequentemente. 


E aí, você está pronto para abraçar todas as suas faces e se tornar um louco e raro?

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Jordino I Blog de Crônicas e reflexões
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Eu sou o Jordino, o escritor que administra este site. Aqui, compartilho reflexões que conectam literatura, filosofia e o dia a dia, sempre buscando provocar boas perguntas e momentos de pausa em meio à correria. Também estou no Youtube é só clicar no ícone abaixo.
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